Menos obras, menos empregos - Correio Braziliense

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Camila Costa
Correio Braziliense

Setor da construção civil estima o fechamento de 192 mil postos de trabalho nos últimos três anos no DF. Com medo do atual cenário econômico, o brasiliense teme investir em imóveis. Segmento trabalha para restabelecer o equilíbrio entre oferta e procura

Sem obra, não há emprego para o pedreiro, para o engenheiro civil, muito menos para o mestre de obras. De 2013 para cá, o setor da construção civil da capital passou por reduções significativas em toda a cadeia produtiva. No fim de tudo, o maior impacto é sentido no fechamento de postos de trabalho. São quase 280 mil desempregados nos últimos três anos, de acordo com levantamento do Sindicato da Indústria da Construção Civil do DF (Sinduscon-DF). Em cenário mais recente, a conta também desanima. A Associação de Empresas do Mercado Imobiliário do DF (Ademi) estima 192 mil empregados atingidos pela recessão.

Segundo o presidente do Sinduscon-DF, Luiz Carlos Botelho, uma forma clara de avaliar a atual situação é fazer um comparativo com relação ao número de postos de trabalhos diretos e indiretos, desde 2013. “Naquele ano, de acordo com o índice mínimo, que é de três vagas por emprego direto, nós dispúnhamos de 90 mil empregos na construção civil, e cerca de 270 mil empregos indiretos, que são aqueles de vendedor de material para obra, fornecedores, etc., ou seja, um total de 360 mil vagas. Hoje, no quadro que temos, são 20 mil postos diretos e 60 mil indiretos”, revela Botelho.

E as expectativas são ainda piores. A previsão do setor é de que os empregos sejam reduzidos um pouco mais. “Se tudo se mantiver como está, os postos poderão cair para 12 mil até agosto.” Para Botelho, é preciso restabelecer o equilíbrio entre a oferta e a procura. “O segmento está trabalhando fortemente para melhorar isso, por meio da legislação, e trabalhando para que a conjuntura mude e mostre uma perspectiva de rompimento do ciclo negativo econômico nacional.” Uma das formas, segundo ele, seria o reaquecimento das obras públicas, o aumento das particulares, comerciais ou habitacionais. “Está tudo paralisado.”

Sócio-diretor de uma incorporadora de empreendimentos residenciais e comerciais que está no mercado brasiliense desde 1998, André Luiz Almeida de Oliveira reduziu o número de funcionários em mais de 90% nos últimos três anos, quando a crise apertou. “O mercado está muito difícil e o setor da construção civil tem sofrido bastante. As empresas estão demitindo, pois não têm obra. Muitas estão no fim e ninguém está começando outros empreendimentos.” Segundo André, o funcionamento é em cadeia: consumidor sem dinheiro e sem emprego resulta em menos investimentos. Principalmente em empreendimentos a longo prazo. “A procura está baixa e o preço, ruim. Ninguém quer arriscar em novos investimentos. Até hoje, nunca passamos algo parecido. Para sobreviver, somente cortando os custos. Reduzir ao máximo a equipe e manter apenas as pessoas-chave. Quando melhorar, volta a crescer”, justifica o empresário.

Há 23 anos na área, Josenildo da Silva recorda os bons tempos. Até 2014, segundo ele, as ligações em busca de orçamento ou serviço eram frequentes. De lá para cá, o negócio só piora, mesmo para quem tem a vantagem de ter um curso superior. “Não está ruim, está horrível. Está pior do que se imagina. Quase impossível trabalhar em obra”, lamenta o engenheiro civil. Josenildo tinha um emprego fixo e rentável, até o ano passado, em uma empresa de construção. Porém, há mais de um ano, a firma não consegue pegar uma obra sequer para tocar. O reflexo disso é sobra de mão de obra no mercado. “Para conseguir alguma coisa, tive que aceitar um outro serviço, sem direitos trabalhistas, o que não é certo. Trabalhei muitos anos somente em Águas Claras, em várias obras, mas, agora, tenho que procurar em outros lugares e até fora de Brasília. Mando currículo e as empresas respondem que já receberam outros 500, 600. É bem difícil.”

O professor do Departamento de Economia da Universidade de Brasília (UnB) Carlos Alberto Ramos não tem dúvidas de que a situação ainda deve perdurar. E, com o aprofundamento da recessão, a tendência é que as empresas, de fato, cortem na folha de pagamento. “A construção civil pede um investimento de longo prazo. Não é como comprar algo no mercado. Seja para morar, seja para ter renda. E qualquer coisa a longo prazo no Brasil está difícil. Não se sabe muito bem sobre a bolha do DF, se vai conseguir manter o emprego, se o salário vai aumentar. São vários fatores que fazem com que a pessoa seja mais prudente”, analisa o especialista, que, no cenário geral, aponta apenas para condições desfavoráveis. “Se você olhar o jornal hoje, verá que a principal financiadora (Caixa Econômica Federal) aumentou os juros, ou seja, tudo vai contra e o cenário não inspira confiança.”

Burocracia

Além do desemprego, outro fator, até mais antigo do que a atual crise do país e do DF, diminui a velocidade produtiva do setor: a burocracia. Os entraves na liberação de projetos e alvarás, principalmente nos últimos quatro anos de governo, têm prejudicado o setor. O presidente da Ademi, Paulo Muniz, afirma que esse fator é um desestimulador para os investidores e um dos motivos da paralisação na construção civil no DF. “Desde 2015 até hoje, já são cerca de 13.300 novos imóveis que aguardam pela liberação do Habite-se, e todos já chancelados pelo GDF. Há oito anos, a gente não levava mais que 120 dias pra aprovar um projeto, hoje tem empreendimento completando ano. O exemplo mais absurdo é o caso do Brasília Torre Palace, no coração de Brasília, que poderia estar em obras, mas está servindo como cracolândia” afirmou.

Piora

A rápida deterioração do mercado de trabalho começou a atingir os trabalhadores mais qualificados. Pelos dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho e Emprego, no ano passado, foram fechados115 mil postos de trabalho com carteira assinada para os brasileiros com ensino superior incompleto ou concluído — um sinal preocupante da piora acelerada da atividade econômica em 2015, que deve continuar neste ano.

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