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Quando você sai da casa dos seus pais, precisa procurar seu primeiro apartamento. Depois, quando se casa e nascem os filhos, arruma um novo imóvel. Esses mesmos filhos buscam suas próprias residências quando crescem, ou você pode se separar do cônjuge e precisar de um novo lar. Resultado: ao longo da vida, diferentes necessidades fazem com que você gaste muito dinheiro na hora de trocar de apartamento.
Não funciona sempre assim, mas é um roteiro bem comum. Por isso, a empresa Molegolar resolveu fazer diferente: e se seu apartamento fosse como um Lego – pudesse ser somado e subtraído diante de mudanças na situação da família?
O criador do negócio, Saulo Suassuna Fernandes Filho, explica que o cliente não se compromete com um grande ou pequeno apartamento logo de cara, e sim pode ir comprando e vendendo “módulos” (espécie de miniapartamentos) de acordo com sua necessidade.
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Com um ano de negócio e um investimento inicial de 100 mil reais, a Molegolar possui quinze empreendimentos em negociação; dois já estão em fase de construção. A expectativa é que os primeiros clientes passem a morar nos módulos no final de 2017. Ao todo, mil desses módulos já foram negociados.
História
Fernandes trabalhava na construtora e incorporadora Suassuna Fernandes, empresa de seu pai. Em 2015, fez um curso no Massachusetts Institute of Technology (MIT) e aprendeu mais sobre como reinventar indústrias tradicionais: a do automóvel, a da música, a de fotografia e a de filmes, por exemplo.
“Se olharmos para a construção civil, chegaremos à mesma conclusão: não faz sentido ter um carro de cinco lugares quando ele só leva duas pessoas, e não faz sentido comprar um CD inteiro quando você só quer uma música”, diz o empreendedor.
Até então, a Molegolar era um braço da Suassuna Fernandes e fazia projetos para a empresa (o primeiro foi fechado em agosto de 2015, e marca o início do negócio). Em 2016, a Molegolar resolveu separar-se da empresa-mãe e ser uma startup independente, inclusive em receita.
A empresa possui a patente dos módulos tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos. Em 2015 o negócio não faturou, já que era o braço de uma empresa; com a independência, a ideia é cada vez mais aumentar a receita.
O faturamento na Molegolar funciona da seguinte forma: o negócio cobra das incorporadoras, que contratam os projetos da startup, 2% do Valor Geral de Vendas (VGV). O VGV é o que se arrecadaria com a venda de todas as unidades de um empreendimento imobiliário.
Porém, esses 2% só chegam ao negócio quando o prédio é efetivamente lançado, explica Fernandes. “A gente fatura essa porcentagem, mas recebe apenas ao longo do tempo. A receita deve aumentar ao longo do ano, porque o número de contratos tende a aumentar também.”
Como funciona?
Para os módulos da Molegolar funcionarem, é preciso que a planta do edifício já esteja pensada para isso: não é possível um prédio já existente mudar para esse modelo, por exemplo.
Em cada andar, são feitos diversos tipos de planos: é possível ter de dois módulos até 12 deles por pavimento. Cada módulo possui entre 30 m² e 80 m² de área. O metro quadrado dos módulos custa, em média, 7 mil reais.
Dentro de cada andar, é possível fazer diversas combinações de módulo. Por exemplo, você pode começar comprando quatro módulos. Porém, seu filho se casou e saiu de casa.
Se fosse um apartamento comum, você teria de continuar sustentando todos os gastos de um grande imóvel ou então vendê-lo e se mudar para um lugar menor. Já pelo Molegolar, é possível vender, alugar ou emprestar a área ociosa do apartamento (um dos módulos, por exemplo). Ou seja: não há metragem fixa de apartamentos por cada andar.
Quando compra um apartamento da Molegolar, o cliente já recebe um manual com sugestões de planta para cada quantidade de módulos. Porém, caso os outros módulos do andar estejam ocupados, será preciso negociar com o vizinho. Também é possível comprar os módulos acima e abaixo e fazer um dúplex.
Vale lembrar que cada módulo possui sua própria documentação, incluindo IPTU e contas de água e luz, por exemplo. Assim, a complicação é menor na hora de vender uma parte do apartamento.
Inovando em um setor tradicional
As empresas tradicionais de construção civil possuem algumas dificuldades, explica Fernandes. Uma delas é que os negócios de alto padrão só entram na etapa de lançamento quando possuem vários acordos fechados – uma garantia diante de um empreendimento com demanda escassa. Com a desaceleração das compras de imóveis, também aumenta o medo de lançar um complexo habitacional que poderá não vingar.
Com a Molegolar, o problema da demanda escassa é resolvido: se não há procura por um apartamento de 4 milhões de reais, por exemplo, é possível dividi-lo em quatro imóveis que valem 1 milhão de reais cada. “Quem opera pelo modelo molegolar pode atender várias demandas ao mesmo tempo, o que gera mais segurança para quem realiza o empreendimento. Você deixa a demanda agir sobre a oferta, enquanto antigamente se ofertava algo fixo, esperando que a demanda se encaixe.”
Essa possibilidade de variar o tamanho do apartamento dinamiza o setor imobiliário, diz o empreendedor. Na forma tradicional, o cliente que não consegue mais quitar o apartamento deve devolver todo o imóvel, sendo despejado; o banco que fez o financiamento deve realizar um leilão do imóvel, que é vendido por um preço abaixo do de mercado. Ou seja, o banco perde dinheiro.
Com a Molegolar, o dono do apartamento pode pagar apenas o módulo que desejar, assim como o banco só precisa fazer uma execução parcial do imóvel. Essa possibilidade diminui o risco para a instituição financeira e, assim, faz com que as taxas de financiamento sejam menores e ocorram mais acordos.“Pode ser uma forma do mercado se recuperar, já que hoje está sofrendo”, defende Fernandes.
Planos para o futuro
A Molegolar fez seus primeiros projetos em Pernambuco, onde foi criada, e já possui contratos negociados nos estados de Alagoas, Bahia, Ceará, Pará, Paraíba, Santa Catarina e São Paulo. O foco de 2016 é consolidar-se no mercado brasileiro. A ideia é dobrar o número de contratos já negociados até o fim deste ano.
Outro plano é ampliar o público da startup, hoje composto pelas classes média e média-alta. “Achamos que o negócio pode funcionar na classe mais baixa também. Por isso, temos um projeto em desenvolvimento para o programa Minha Casa, Minha Vida aqui em Recife.”
Já em 2017, a ideia é conquistar o mercado internacional: um objetivo que está em vista desde a criação da patente nos Estados Unidos, o primeiro alvo da startup.
Além das estratégias de expansão, a Molegolar também está desenvolvendo um aplicativo para facilitar a interação entre cliente e corretor e simplificar a produção de projetos de plantas com os módulos.
“Estamos negociando a entrada de um sócio de uma empresa de internet, o que irá facilitar o desenvolvimento do app e a expansão da Molegolar para outros países, já que ele possui experiências no Vale do Silício”, resume Fernandes.