Rosana Hessel
Correio Braziliense
Principal fator para promover o crescimento sustentável da economia, os investimentos continuam em queda
Após 12 trimestres com desempenho negativo, o Produto Interno Bruto (PIB) registrou alta de 0,3% entre abril e junho, na comparação com o mesmo intervalo do ano anterior. No entanto, os investimentos continuaram em queda. O indicador conhecido como Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF) sofreu contração de 6,5% no segundo trimestre de 2017, a 13ª consecutiva, conforme dados divulgados ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
De acordo com o órgão, o recuo é explicado, principalmente, pela queda das importações de bens de capital e pelo desempenho ruim da construção civil. Outro dos principais motores do investimento, os gastos do governo encolheram 2,4%. Foi o nono trimestre seguido de retração.
“A recuperação do investimento será gradual e não deve ocorrer neste ano”, avisou o economista Evandro Buccini, da Rio Bravo Investimentos. Ele ressalta que o plano de privatização de estatais, anunciado recentemente pelo governo, pode ajudar a reverter o quadro a partir do próximo ano. “Mas é preciso que o plano saia do papel e que o mercado de crédito melhore para a pessoa jurídica”, explicou.
O economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale, observou que o resultado do PIB acabou surpreendendo positivamente apesar da “crise política sem precedentes”, deflagrada em maio. “O que se imaginava muito negativo para a economia acabou não acontecendo. Antes da crise, já se imaginava um resultado não muito diferente do que ocorreu no trimestre”, destacou.
O ritmo dos investimentos vinha caindo na comparação anual, mas o recuo de 6,5% entre abril e junho ficou bem acima dos 3,7% de janeiro a maio. “A queda se acentuou, o que, em parte, pode ser atribuído à crise política, mas também à base de comparação muito alta de junho do ano passado”, acrescentou.
Impacto
Para Sérgio Vale, da MB Associados, o impacto da crise política nos investimentos deve continuar nos próximos três meses, como ocorreu em 2005, durante o escândalo do Mensalão. Naquele ano, a crise afetou negativamente o investimento no terceiro trimestre.
“Com a estabilidade política que veio a seguir, o investimento voltou a acelerar, o que parece ser o caso novamente agora, guardadas as devidas proporções. Desta vez, a recuperação será mais lenta, dada a forte recessão”, afirmou.
Construção afunda a indústria
Por Rodolfo Costa
A indústria não conseguiu manter o crescimento de 0,7% do primeiro trimestre e registrou queda de 0,5% nos três meses seguintes, dando sinais de que ainda não entrou em trajetória firme de recuperação. Analistas lembram que o recuo da indústria foi puxado pela construção civil, que caiu 2% no período de abril a junho. A indústria de transformação, por sua vez, avançou 0,1%.
A queda da construção civil foi a maior entre os segmentos que compõem o setor industrial. Foi a sexta retração trimestral consecutiva, algo nunca antes registrado na história da atividade, que enfrenta uma crise sem precedentes. Em relação ao segundo trimestre de 2016, o tombo foi de 7%.
No caso da indústria de transformação, o desempenho do segundo trimestre mostrou um setor “praticamente estável”, de acordo com o economista Marcelo Azevedo, da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Segundo ele, a expectativa é que a recuperação continue gradual nos próximos meses.
“O que vem ocorrendo é uma oscilação da indústria, o que é comum em períodos de saída de crise. Em julho, por exemplo, houve um resultado mais positivo, e a tendência é chegarmos a um crescimento de 0,5% no acumulado do ano”, afirmou Azevedo. Ele lembrou que a taxa de ociosidade no setor ainda é elevada, alcançando 32,6% da capacidade instalada.
A Câmara Brasileira da Indústria da Construção (Cbic) atribui o cenário desolador da atividade à ainda fraca demanda na economia. A queda dos investimentos das empresas emperra lançamento de novos empreendimentos. O recuo do consumo do governo, por sua vez, freia a geração de negócios com a administração pública. Já as despesas das famílias ainda não são firmes o suficiente para possibilitar a recuperação do setor.
“Faltam estímulos para a construção civil crescer. É uma cadeia de produção enorme que ainda não tem solução. Faltam marcos regulatórios para fechar parcerias público-privadas (PPPs); confiança dos empresários para investir; ou emprego, renda e crédito para as famílias consumirem”, lamentou o presidente da Cbic, José Carlos Martins.
Agropecuária fica estável
A agropecuária não conseguiu manter o forte crescimento que puxou a economia do país no primeiro trimestre. Após ter avançado 11,6% no início do ano, o setor estagnou (0,0%) no acumulado entre abril e junho, na comparação com os três meses imediatamente anteriores.
O resultado, porém, já era esperado e, para muitos analistas, não seria surpresa se tivesse sido registrada queda, após a forte expansão dos três meses anteriores. O cenário, porém, não é considerado negativo. Na avaliação do economista-chefe da Gerencial Auditoria e Consultoria, José Luiz Amaral Machado, o setor continua robusto.
Machado avalia que o resultado só não foi melhor devido à crise gerada pela divulgação, em maio, da gravação da conversa entre o empresário Joesley Batista, dono da JBS, uma das maiores processadoras de carne do mundo, e o presidente Michel Temer. “Os impactos não recaíram apenas sobre a empresa. Houve uma contaminação geral das expectativas que comprometeu os investimentos e a evolução dos negócios”, analisou.
O desempenho neutro na passagem trimestral, no entanto, não mostra o potencial do setor, advertiu o economista-chefe da Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul), Antônio da Luz. Na comparação interanual, ou seja, com o mesmo período do ano passado, o PIB da agropecuária avançou 14,9%. No primeiro trimestre, a alta havia sido de 15,2%. Isso mostra, segundo ele, que o setor seguiu produzindo tanto quanto antes.