Agência CBIC
Um material extremamente aplicável e passível de se tornar um guia para a construção civil nacional no âmbito da Segurança e Saúde no Trabalho (SST). Esse é um dos objetivos do livro ”Segurança e Saúde do Trabalho na Indústria da Construção Civil”, organizado pelo engenheiro e especialista em Engenharia de Segurança, Hugo Sefrian Peinado, com a participação de 20 autores, entre médicos e psicólogos do trabalho, engenheiros eletricistas e de segurança do trabalho e higienista ocupacional, entre outros profissionais que são referências em suas áreas, o que garante a qualidade e aplicabilidade das questões abordadas sobre a temática da saúde do trabalho na indústria da construção.
Em entrevista exclusiva ao CBIC Hoje+, Hugo Sefrian, que também é professor do Departamento de Engenharia Civil da Universidade Estadual de Maringá (DEC/UEM) e atua como docente e orientador em cursos de especialização em Construção Civil e em Engenharia de Segurança do Trabalho, aborda questões como a importância de estudos e pesquisas voltadas para a área de SST na indústria da construção.
Recém lançada, a publicação conta com apoio da Câmara Brasileira da indústria da Construção (CBIC) e do Sesi Nacional.
Os interessados podem acessá-la no site da CBIC, na área da Comissão de Política de Relações do Trabalho (CPRT) da entidade.
Hugo Sefrian Peinado: Não. Deve-se compreender que a segurança e a saúde do trabalhador não são campos de interesse exclusivo dos funcionários e das empresas, mas também do governo e de toda a sociedade, já que acidentes, além de comprometerem a integridade dos trabalhadores, resultam em impactos sociais e elevado ônus econômico. Os acidentes do trabalho interferem no nível de satisfação do trabalhador e no bem-estar geral da população, além de afetar na produtividade econômica e impactar substancialmente o sistema de proteção social. A ausência de segurança nos ambientes de trabalho no Brasil também onera o país em função de gastos com benefícios acidentários e aposentadorias especiais, assistência à saúde do acidentado, indenizações, retreinamentos, reinserção no mercado de trabalho e horas de trabalho perdidas.
C.H.+: Qual a importância de estudos e pesquisas voltadas para a área de SST na indústria da construção?
H.S.P.: A indústria da construção civil apresenta uma série de características que a distingue dos demais ramos de serviço (conteúdo tratado no capítulo 1). Ao entender isso, fica evidente que as soluções com o foco na preservação da segurança e da saúde do trabalhador adotadas em outras indústrias talvez não se apliquem à realidade da construção civil. Um outro ponto a considerar é que, mesmo sistemas de segurança desenvolvidos para a construção não se aplicarão em todos os casos. Veja que, com a exigência de se instalar um sistema de Guarda-corpo e Rodapés (GcR) padronizado pela NR-18 onde houver risco de queda, a forma de fixação desse GcR em uma estrutura convencional em concreto armado será diferente daquela utilizada para construções em paredes de concreto com fôrmas metálicas, por exemplo (conteúdo tratado no capítulo 3).
Uma particularidade da nossa indústria é que, em obras de construção, temos mudanças dos tipos de serviços realizados ao longo do tempo: as diversas etapas dentro de uma mesma obra apresentarão atividades distintas que vão requerer novas medidas que garantam a segurança e a saúde do trabalhador.
Em todas essas etapas da obra, teremos riscos de acidentes, ergonômicos, físicos e químicos e, em algumas delas, teremos riscos biológicos. Não há práticas, sistemas ou tecnologias disponíveis no mercado para prevenir todos esses riscos.
Nesse contexto, o fomento e o desenvolvimento de estudos e pesquisas no campo de SST aplicado à indústria da construção é fundamental, de modo a criar procedimentos, ferramentas e tecnologias que permitam, cada vez mais, garantir a segurança e a saúde do trabalhador no desenvolvimento de suas atividades laborais.
C.H.+: Qual a relevância da observância das normas de SST para a construção do país?
H.S.P.: Quando tratamos de normas de SST, as que vêm à mente inicialmente são as Normas Regulamentadoras (NRs). Olhando, portanto, para as NRs, pontua-se que parte do setor da construção civil não atende à maioria dos parâmetros trazidos por elas. Nesse contexto, destaca-se que os trabalhadores da construção compreendem cada vez mais a importância da SST e atuam de forma preventiva na realização de seus serviços quando a gestão da obra está efetivamente engajada com essa área, inclusive encaminhando a equipe para treinamentos sobre SST. No entanto, é comum os gestores da obra conhecerem apenas alguns aspectos da NR-18, mas de forma superficial. Além disso, desconhecem quase que totalmente o conteúdo trazido pelas demais NRs. O conhecimento raso ou o desconhecimento a respeito do conteúdo das NRs e a falta de consciência de segurança entre os gestores faz com que, por exemplo, programas extremamente importantes, como o Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA) e o Programa de Condições e Meio Ambiente de Trabalho na Indústria da Construção (PCMAT), apesar de existirem na obra, simplesmente não sejam implementados no canteiro de obras de forma efetiva, o que compromete ainda mais a segurança do trabalhador.
Há ainda outras normas e textos de recomendações, como as Recomendações Técnicas de Procedimentos (RTP) e as Normas de Higiene Ocupacional (NHO) da Fundacentro, dentre diversos outros (tratados no capítulo 1), que são fundamentais para a melhoria nas condições de trabalho, de forma a conferir maior segurança e a preservação da saúde do trabalhador.
O não atendimento aos requisitos trazidos por essas normas resultam no panorama que temos hoje no setor da construção civil: Elevado índice de acidentes. Segundo o Anuário Estatístico da Previdência Social de 2017, em 2015, o setor da construção foi responsável por 10,28% dos acidentes ocorridos naquele ano, enquanto em 2016, esse índice foi de 9,53% e, em 2017, 8,70%. Em todos esses anos, a atividade que resultou em maior quantidade de acidentes foi a de construção de edifícios.
A atender aos parâmetros trazidos pelas normas de SST, o índice de acidentes e doenças do trabalho irá, potencialmente, diminuir.
No entanto, é importante compreender também que essas normas trazem parâmetros mínimos a serem observados. No geral, o atendimento a esses parâmetros é insuficiente para garantir a segurança e preservar a saúde dos trabalhadores no desenvolvimento de suas atividades. Isso implica dizer que, ao garantir o atendimento a essas normas (o que é obrigatório), não necessariamente o gestor terá uma obra segura para os trabalhadores. É necessário ir além dos conteúdos desses textos normativos e atuar ativamente na criação e desenvolvimento de um Sistema de Gestão de Segurança e Saúde do Trabalho (SGSST) dentro da empresa.
C.H.+: Como o livro Segurança e Saúde do Trabalho na Indústria da Construção Civil pode contribuir no dia a dia dos profissionais da construção civil e de SST?
H.S.P.: Esse livro pode ser utilizado como uma guia de SST para canteiro de obras. Ao longo dos capítulos, os profissionais da construção civil e de SST perceberão que se trata de um livro extremamente prático e enriquecido com muitas informações que tratam exatamente do dia a dia de uma construção.
A título de exemplo, de modo que o leitor perceba as contribuições que esse livro pode trazer para o seu cotidiano de atividades, destaco alguns conteúdos de alguns dos capítulos:
No capítulo 1, são tratados em detalhes os programas, documentos, treinamentos, dentre outros procedimentos obrigatórios à construção trazidos pelas NRs e por outros textos de recomendações ou normativos;
No capítulo 2, há uma série de recomendações de boas práticas socialmente responsáveis a serem trabalhadas pelas construtoras com foco no trabalho digno (alfabetização digital, capacitação técnica da mão de obra, manutenção do canteiro de obras humanizado, dentre outras);
No capítulo 3, são trazidos os equipamentos de proteção coletivas (EPCs) necessários às obras, especificações técnicas, critérios de projeto (cargas a serem suportadas, por exemplo) para cada um dos EPCs e sistemas disponíveis do mercado que têm potencial de atendimento a esses requisitos;
No capítulo 7 e 9, são discutidas as principais doenças ocupacionais que ocorrem na construção civil e são trazidas práticas de primeiros socorros aplicada ao canteiro de obras, respectivamente;
No capítulo 10, dentre outros aspectos, é discutida a motivação do trabalhador na perspectiva da psicologia do trabalho;
No capítulo 11, traz-se a gamificação como ferramenta para identificar o perfil de jogador na construção e, a partir dessa classificação, desenvolver práticas motivacionais para cada perfil de trabalhador na empresa, e
No capítulo 14, são discutidas perspectivas de desenvolvimento para a construção civil no âmbito de SST, principalmente voltada à utilização de realidade virtual e realidade aumentada.
C.H.+: Dos temas abordados na publicação, qual o senhor destacaria como fundamental a sua observância?
H.S.P.: Destaco que todos os temas tratados no livro são fundamentais. É interessante perceber, no entanto, que há capítulos que auxiliarão as empresas hoje e outros que auxiliarão ela futuramente, a depender do seu estágio de engajamento com o campo de SST.
C.H.+: O que definiu a participação dos 20 autores?
H.S.P.: Considerando a Segurança e a Saúde do Trabalhador da Construção Civil como áreas bastante amplas, a escrita do livro por 20 autores foi decisiva para garantir sua qualidade e aplicabilidade, uma vez que a temática de cada capítulo foi escrito por profissionais experientes e de referência naquela área. Ter a temática de saúde do trabalho abordada por um médico do trabalho, a de psicologia do trabalho tratada por psicólogos do trabalho, a de segurança em eletricidade tratada por engenheiro eletricista e engenheiro de segurança do trabalho, a de higiene ocupacional por um higienista ocupacional, dentre outros, resultou em um material extremamente aplicável e passível de se tornar um guia para a construção civil nacional no âmbito de SST.
C.H.+: Na sua visão, qual a importância das iniciativas desenvolvidas na área de SST para a construção civil?
H.S.P.: A atuação da CBIC e do Sesi no campo de SST aplicado à construção civil tem sido decisiva para conscientizar o setor no âmbito da importância da segurança e da saúde do trabalho, assim como para capacitar e atualizar gestores e mão de obra frente aos procedimentos normativos, tecnologias aplicáveis à construção, dentre outras. A realização de eventos técnicos e cursos de capacitação voltadas à SST, publicação de manuais orientativos e participação ativa nos processos de revisão de normas de segurança são algumas dessas práticas da CBIC e do Sesi com o foco no aperfeiçoamento da construção civil nacional.