Domingos Zaparolli e Roberto Rockmann
Valor Econômico
A indústria da construção caminha para o quarto ano de retração. Entre 2014 e 2016 o PIB setorial recuou 13,3% e o nível de emprego caiu 14,3%. Para 2017 era esperado o início da recuperação das atividades. A Fundação Getulio Vargas (FGV) estimou um crescimento de 0,5% para o ano. Mas a lenta retomada econômica, a instabilidade política e a insegurança jurídica nos contratos levaram a FGV registrar um declínio na confiança dos empresários do setor a partir de abril e, consequentemente, a uma menor disposição ao investimento.
"Há um clima de incerteza em um horizonte já conturbado para o setor de construção e a economia brasileira, os projetos de infraestrutura não vão andar se houver insegurança", diz José Carlos Martins, presidente da Câmara Brasileira da Indústria de Construção (Cbic). Na semana passada, empresários e líderes da construção civil se reuniram em Brasília no 89º Encontro Nacional da Indústria da Construção (Enic) para debater os problemas que afligem o setor e encaminhar sugestões ao Executivo e Legislativo.
Um grupo de 30 empresários da construção liderados por Martins levou ao presidente Michel Temer um conjunto de propostas, entre elas o estímulo às concessões e as Parcerias Público Privadas (PPPs) no âmbito federal, mas também nos municípios. Lançamento de editais para aeroportos regionais e armazéns, leilões de pequenas centrais de hidrelétricas, renegociação das dívidas das carteiras imobiliárias das incorporadoras e a aprovação das reformas estruturais, como a trabalhista e previdenciária.
Presente no 89º Enic, o ministro da Fazenda Henrique Meirelles disse que as reformas estruturais podem elevar o potencial do PIB para os próximos dez anos de 2,3% ao ano para 3,7%. "A reforma é cada vez mais uma consciência nacional e está incorporada à nação", afirmou. José Romeu Ferraz Neto, presidente do Sindicato da Indústria de Construção de São Paulo (SindusconSP), diz que 2017 está sendo muito pior que o previsto, tanto em relação à indústria imobiliária residencial e comercial quanto em concessões e obras públicas. "Só teremos um horizonte azul a partir de 2018 se as reformas avançarem e o país recuperar fôlego para investir e as concessões e PPPs deslancharem. Senão, será outro ano perdido."
No mercado imobiliário, as 20 maiores incorporadoras do país lançaram 69,8 mil unidades residenciais em 2016, uma queda significativa em relação ao primeiro ano da crise no setor, 2014, quando os lançamentos somaram 75 mil unidades. No entanto, 44,2 mil das residências vendidas no ano passado foram alvo de distratos, ou seja, o cancelamento das vendas.
Estas mesmas empresas contam atualmente com um estoque conjunto de 95 mil unidades. No ritmo atual, corresponde a 17 meses de venda. "Com esse estoque e as incertezas políticas e econômicas do país, não faz sentido pensar em novos lançamentos", diz Luiz Antonio França, presidente da Associação Brasileira das Incorporadoras (Abrainc). O único segmento do mercado imobiliário com demanda garantida é o de moradia popular. Em fevereiro o governo lançou uma nova etapa do Minha Casa Minha Vida com a meta de comercializar 610 mil imóveis em 2017, volume que não terá dificuldade de ser alcançado, avalia o vicepresidente do SindusconSP, Ronaldo Cury.
A secretária Nacional de Habitação, Maria Henriqueta Alves, informa que o governo está realizando estudos para lançar dois novos programas ainda em 2017 como forma de amenizar o déficit habitacional do país, estimado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 6 milhões de moradias em 2014. Um programa em avaliação é voltado para a locação social acessível, o outro é uma PPP habitacional, nos moldes adotados pelo governo de São Paulo.
O ministro das Cidades, Bruno Araújo, anunciou que o governo editará, nas próximas semanas, uma medida provisória para dar às empresas privadas os mesmos direitos das empresas públicas no acesso a recursos para investimento em saneamento básico. O secretário executivo do Ministério das Cidades, Marco Aurélio Queiroz, informou que será lançado no fim de junho um edital de contratação de R$ 2 bilhões em obras para saneamento. Outra prioridade é reativar 167 projetos que estavam paralisados. "Destes, 25 foram concluídos, 88 retomados e 40 tiveram seu cronograma repactuado", diz Queiroz.
Na área de infraestrutura, novos negócios poderão surgir ao longo dos próximos meses. Uma das principais apostas, que está na relação de propostas do setor encaminhadas ao presidente Temer, é o lançamento de um programa de concessões e PPPs em cidades menores. A expectativa é que seja criado um fundo gerido pela Caixa Econômica Federal para apoiar a contratação de projetos de modelagem econômico financeira para municípios que pretendam atrair a iniciativa privada para investir nas áreas de saneamento, mobilidade urbana, resíduos e iluminação pública.
A ideia é que, quando o empreendimento sair do papel e for licitado, o investidor terá de ressarcir o projeto, de forma que o fundo sempre tenha recursos para investir em novos projetos para outras cidades. "Se bem sucedida, essa ideia pode ser estendida a outros segmentos, como estacionamentos, garagens, parques públicos", diz Queiroz. O governo também estuda a criação de um mecanismo de proteção cambial para as concessões de rodovias que forem licitadas nos próximos meses. Uma ideia em debate é criar a Conta de Desenvolvimento Rodoviário (CDR), nos moldes da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), encargo setorial criado no setor elétrico em 2002.
A conta teria um aporte inicial do Orçamento Geral da União e posteriormente seria provida com a concessão de rodovias federais. Uma parte dos recursos poderia ser usada para proteção cambial. "Os investimentos dessas concessões são vultosos e estamos trabalhando para atrair investidores internacionais, que pedem uma proteção cambial", afirma o diretor de parcerias do Ministério dos Transportes, Fabio Freitas.
Outra aposta que pode se converter em encomendas para a indústria pesada são as licitações previstas no Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), criado em maio do ano passado. Um dos destaques no segundo semestre será para o setor de energia. Em 27 de outubro, serão realizadas duas rodadas de licitação nas áreas de partilha do présal, cuja outorga estimada pode ficar entre R$ 1,2 bilhão e R$ 4,7 bilhões, informa o secretário de Articulação de Investimentos de Parcerias do PPI, Marcelo Allain.
Em energia elétrica, o BNDES está trabalhando na modelagem econômico financeira da privatização das seis distribuidoras da Eletrobrás (Amazonas, Acre, Alagoas, Piauí, Rondônia e cidade de Boa Vista, Roraima), cujas receitas somam R$ 10,8 bilhões. A expectativa é de que os leilões sejam feitos do segundo semestre até início de 2018. Na área de transportes, o governo prepara a licitação de três novos lotes de estradas. Os trechos, que serão licitados sob o critério de menor tarifa, devem demandar cerca de R$ 15 bilhões em investimentos.